Imagem via: Site de Imprensa de Pokémon

A natureza de uma prequela (“prequel”, em inglês), ou de uma história que se passa no passado de uma série, diz que ela precisa explicar pelo menos um pouco da série a qual ela está inserida. Tudo, desde o “É o Darth Vader quando criança” com Star Wars: Episódio I – A Ameaça Fantasma até “Ah, então foi aqui que surgiu os Xenomorfos” com Prometheus, surgiu para atender a uma chamada fundamental: nostalgia transformada em livro de instrução. Pokémon Legends: Arceus, ambientado na região de Sinnoh do passado (conhecida naquela época como região de Hisui), também faz isso. Tudo, desde uma explicação direta de dicas distintas e óbvias até penteados familiares, ajuda a criar uma imagem de como surgiu o mundo Pokémon como o conhecemos.

Esse é, de longe, o jogo de Pokémon com maior interesse em explorar por completo o seu próprio mundo. E acredito que, assim como a maioria das prequelas, jogar Pokémon Legends: Arceus torna quase impossível de olhar para a franquia principal do mesmo jeito de antes.

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Isso porque Pokémon é, como você pode imaginar, “feito diferente”.

Frequentemente, muitas críticas são feitas aos jogos da série por terem histórias ruins e narrativas nada impressionantes, mas acredito que isso pode ser visto de jogo a jogo, e não com a série de Pokémon como um todo. Na minha opinião, as histórias da franquia de Pokémon dependem do quanto o jogador se envolve com elas. Embora a barra certamente tenha subido e o senso de construção do mundo tenha se tornado mais evidente desde a primeira geração, a série manteve uma distância entre sua jogabilidade e os detalhes de seu mundo.

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Se quiser, o primeiro elemento consegue ser aproveitado sem o segundo.

Por exemplo, quando você explorou a mansão abandonada da Ilha de Cinnabar em Pokémon Red & Blue, você encontrou diários que enigmaticamente discutiam a descoberta de Mew e o nascimento de Mewtwo. Em nenhuma parte do jogo lhe é dito que você precisa ler esses textos e se aprofundar neles, pois isso não afeta em nada o seu eventual encontro com Mewtwo na Caverna de Cerulean. Em vez disso, ele é só é importante o quanto você permite que seja. O mesmo vale para os mitos de regiões como Hoenn ou Sinnoh, ou todos aqueles detalhes “slice-of-life” em uma ambientação como a de Alola que lhe dá uma visão maior de como a comunidade de Pokémon funciona com pitadas de informação. Os objetivos que você completa não estão muito longe disso e muitas vezes tentam se amarrar a eles, mas você pode vencer o jogo completamente sem apreciar qualquer relevância que eles possam ter.

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Pokémon Legends: Arceus, por pura força de entusiasmo e atenção constante às próprias fábulas únicas de Pokémon, transforma qualquer subtexto em texto. Não me entendam mal, ainda há muitas pequenas coisas que você pode ignorar ou ficar obcecado. O jogo está repleto de pequenos toques, como certos objetos e fragmentos de escrita que atiçam o seu detetive interior. Mas por causa da sua ambientação “Poké-histórica”, você é bem menos compelido a fazer isso.

Só o fato de que as Pokébolas são pequenas engenhocas arcaicas que você pode construir muda seu espaço mental para a experiência. Isso faz o jogador fazer indagações do tipo “como isso aqui virou as Pokébolas dos jogos ambientados nos tempos modernos?” O mesmo vale para a ideia social de Pokémon, já que muitas pessoas nesse jogo têm medo deles, em vez de ficarem instantaneamente obcecadas por eles. E, enquanto muitos jogos lhe dão trabalho de fazer uma pesquisa, Pokémon Legends: Arceus traz isso a uma escala quase arqueológica. A biologia do mundo Pokémon sempre foi fascinante, assim como uma cultura que está quase puramente a serviço dos monstros, e Pokémon Legends: Arceus dá a ela uma razão de ser.

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A abordagem simplificada com menos batalhas de treinadores e menos pontos de checagem tradicionais significa encontrar um novo ritmo de progressão entre todas as informações que estão sendo empurradas em nosso caminho. Nisso, temos uma revelação do tipo “pare e aprecie as flores”. Afinal, Pokémon Legends: Arceus possui mais história do que um jogo tradicional de Pokémon? De forma mais concentrada, sim. Porém, se for para bater um martelo nessa questão, espero que esse jogo permita aos jogadores que realmente não levaram em consideração a construção do mundo de Pokémon reavaliem o que significa estar nele.

Creio que isso seja mais benéfico com Pokémon Scarlet & Violet, outro grande jogo de Pokémon também lançado em 2022 e que tomou toda a atenção de Pokémon Legends: Arceus graças ao seu impacto cultural maior (em partes por seus méritos, em outra por seus bugs e glitches vistos na sua época de lançamento). O mundo de Pokémon Scarlet & Violet é expansivo e divertido de se explorar, mas muito dele é vazio fora dos fatores de ambiente. Tendo acabado de jogar Pokémon Legends: Arceus, eu me via submerso em cada canto e ficando atento a cada linha de diálogo que, em outros jogos, eu estaria passando rapidamente martelando o botão A.

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Como ele se encaixa no mundo de Pokémon? Qual é a função de tudo isso e o que isso pode me falar sobre como esse universo funciona?

Por exemplo, é bem óbvio que a Capitã Cyllene da Equipe Galáctica se parece muito com Cyrus, o líder fanático da Equipe Galáctica de Pokémon Diamond, Pearl e Platinum que quer criar um novo mundo. Em determinado ponto do jogo, Cyllene diz “Eu lhe prometo... eu passarei o nome da nossa equipe, e os contos de suas conquistas, para meus descendentes”. Obviamente, é possível imaginar de onde veio o nome da atual Equipe Galáctica, mas também é a origem das visões de grandeza descomunais de Cyrus. Imagine tentar viver de acordo com uma história de descoberta tão exuberante e perfeita. Existem algumas coisas assim em Pokémon Legends: Arceus e muitas vezes elas existem bem na frente do seu nariz.

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Eu sempre fui fascinado pelo mundo de Pokémon dessa maneira. Sendo fã desde 1998, eu passei muito tempo tentando solucionar esse quebra-cabeça. Quais detalhes do jogo criaram uma história maior? Como isso se relaciona com o anime ou com as coisas que vemos nas cartas ou no mangá? Conforme os jogos de Pokémon se tornaram maiores e os detalhes (especialmente os visuais) se tornam mais evidentes, o quadro maior está nos dando possibilidades mais concretas se nós olharmos com atenção. E quando você combina os objetivos do jogador com o senso de fantasia introduzido por Pokémon Legends: Arceus, descobrimos que as histórias dos jogos estão longe de serem sem graça.

As melhores histórias dependem apenas do nosso interesse nelas.

Texto baseado no escrito por Daniel Dockery. Você pode seguí-lo no Twitter.

Samir “Twero” Fraiha é redator de notícias da Crunchyroll.pt. Formado em Letras e em Artes Visuais, curte animes, mangás e games desde os 5 anos e é fã dos jogos da CyberConnect2. É bem ativo no Twitter como @Twero e também gosta de gravar e editar podcasts.